As apostas online estão em toda parte: em banners durante jogos de futebol, em anúncios nas redes sociais, nos feeds de influenciadores. O acesso é fácil, o estímulo é constante e para muitas pessoas, parar de apostar se torna um desafio real.
Entender o ciclo do vício em jogos online é essencial para reconhecer os sinais de alerta, acolher quem enfrenta esse problema e buscar caminhos de recuperação. O jogo deixa de ser uma escolha quando passa a ser uma necessidade, e isso não acontece por falta de força de vontade, mas por um conjunto complexo de fatores emocionais, neurológicos e sociais.
O que acontece no cérebro de quem aposta compulsivamente
Apostar ativa áreas do cérebro relacionadas à recompensa e ao prazer imediato, principalmente o circuito dopaminérgico. A cada rodada, aposta ou giro de uma roleta virtual, o cérebro libera dopamina, o ‘neurotransmissor do prazer’.
Esse estímulo cria uma sensação de excitação intensa, parecida com o que acontece com o uso de substâncias psicoativas. Com o tempo, o cérebro passa a associar o ato de apostar ao alívio de tensões e ao prazer imediato, exigindo quantidades cada vez maiores de estímulo para atingir o mesmo efeito.
“Durante uma sessão de aposta, o sistema de recompensa do cérebro é ativado de maneira intensa, principalmente com a expectativa de ganho. Isso cria uma espécie de reforço que dificulta ao indivíduo diminuir ou parar com o comportamento do jogo, mesmo diante de prejuízos”.
Isadora Saldanha, psicóloga
Os mecanismos que reforçam o comportamento de risco
Além da dopamina que é liberada no cérebro, as plataformas de apostas projetam ações para manter o jogador engajado — assim como qualquer outro site ou app de compras. Então, vários mecanismos psicológicos e tecnológicos reforçam esse comportamento, tornando o ciclo do vício mais difícil de romper.
Ganhos intermitentes, estímulos visuais e reforço imediato
Ao contrário de uma sequência de vitórias previsível, os ganhos intermitentes, ou seja, que ocorrem de forma aleatória e irregular, geram maior excitação e mantêm o jogador na expectativa constante do próximo acerto. Esse padrão é altamente viciante.
Somado a isso, há o uso de sons vibrantes, gráficos chamativos, recompensas animadas e bônus instantâneos, reforçam o comportamento e prolongam a permanência do jogador na plataforma. É o mesmo princípio usado em redes sociais e videogames, por exemplo: quanto mais estímulo e resposta rápida, mais difícil é desconectar.
Como o ciclo do vício se instala e se repete
O ciclo do vício em apostas segue padrões comuns e, muitas vezes, silenciosos. Por isso, entendê-los é o primeiro passo para rompê-los.
Fase de excitação
O jogador inicia com apostas pequenas e controladas, motivado pela curiosidade ou pelo desejo de diversão. Quando experimenta ganhos iniciais, o prazer reforça o comportamento e cria a sensação de que a sorte está ao seu lado.
Fase de perda
Com o tempo, surgem as perdas, mas ao invés de parar, o jogador continua, acreditando que vai recuperar o valor perdido na próxima aposta. Essa perseguição constante por uma ‘recuperação de prejuízo’ (chamada em inglês de chasing losses) é uma armadilha perigosa que aprofunda o descontrole.
Fase de descontrole
O valor das apostas aumenta. O jogador começa a mentir para familiares, usar dinheiro reservado para outras despesas e pode até recorrer a empréstimos. A culpa aparece, mas é aliviada momentaneamente com mais apostas, reforçando o ciclo.
Fase de dependência
A aposta vira parte da rotina. A pessoa sente ansiedade quando não aposta, perde o interesse por outras atividades e sofre consequências financeiras, emocionais e sociais.
Quando o jogo deixa de ser lazer e se torna uma necessidade
Um dos maiores desafios para quem aposta com frequência é reconhecer o momento em que o jogo deixou de ser uma escolha e passou a ser uma obrigação emocional, ou seja, que ele já chegou à última fase que citamos acima e está dependente das apostas, uma doença conhecida como ludopatia, que apresenta alguns sinais:
- o jogador aposta para aliviar o tédio, a ansiedade ou o estresse;
- sente culpa após jogar, mas volta no dia seguinte;
- gasta mais do que pode, mesmo tentando controlar;
- esconde suas apostas de familiares ou amigos;
- percebe que sua rotina e seu humor giram em torno do jogo.
Quando isso acontece, é um sinal claro de que é hora de pedir ajuda!
Caminhos para interromper esse ciclo: ajuda profissional e redes de apoio
Parar de apostar é possível, mas exige uma abordagem multidisciplinar e, principalmente, apoio contínuo. Veja os recursos mais recomendados por profissionais da saúde mental.
Acompanhamento psicológico
Terapias como a Cognitivo-Comportamental (TCC) ajudam a identificar os gatilhos emocionais, desenvolver estratégias para evitar recaídas e criar uma nova relação com o prazer e o risco. “A TCC permite resgatar a autonomia e reestruturar a forma como o indivíduo lida com suas emoções e impulsos. É um processo que deve iniciar com uma decisão e também passa pelo apoio familiar”, destaca Isadora.
Apoio psiquiátrico
Em casos mais graves, pode haver a necessidade de prescrição de medicamentos para controle da ansiedade, impulsividade ou sintomas depressivos. Somente um médico psiquiatra, após avaliação clínica, pode indicar o tratamento adequado.
Grupos de apoio
Iniciativas como os Jogadores Anônimos funcionam com base na partilha de experiências e suporte mútuo. Elas ajudam o indivíduo a perceber que não está sozinho, fortalecem a rede de acolhimento e reduzem o estigma em torno do vício.
Rede familiar e comunitária
Como a psicóloga Isadora Saldanha comentou, a compreensão de familiares e amigos próximos tem papel crucial na recuperação. “A escuta sem julgamentos e o apoio para reconstruir a rotina fortalecem o processo terapêutico”.
Conte com o Instituto Bet Responsável
Entender o ciclo do vício em apostas é um passo importante. Mas sair dele exige ainda mais: apoio, acolhimento e acesso a informações confiáveis. E o Instituto Bet Responsável está aqui para isso: atuar para transformar a forma como a sociedade lida com o jogo, promovendo ações de prevenção, conscientização e orientação para jogadores, familiares, educadores e operadores do setor.
Se você ou alguém próximo está enfrentando dificuldades para parar de apostar, saiba: você não está sozinho. Estamos aqui para ajudar!